Confissões de um solitário vagabundo III (Sobre empreitadas determinantes, entre leituras e vivências de um mundo comum)
É tarde já estamos indo, à deriva com os olhos marcando o compasso das sucessões temporais, descubro ou descobrimos, através das relações interpessoais, que construímos como hábitos desde já e possíveis em sua necessidade, um asco inevitável ao trabalho. A pedra rolou de monte abaixo, destroçando o Sísifo moderno como um inseto indefeso e por si só asqueroso, transformando os dias em insuportáveis instantes na órbita do tempo. Costumo definir tal sensação como consciência de ser num mundo estático/posto, em grades imperceptíveis, que assolam anseios e liberdades. A fábrica não mais tão distante, não está mais em lugares à margem do escopo urbano das cidades, ela se integrou aos agentes capitalistas e se tornou factual nas relações. Os manuais acadêmicos vomitam abstrações que acabam sendo abafadas por não trazerem gozo algum em suas leituras, até porque não há necessidade qualquer disto no mundo comercial, e isto se traduz em conformismo sorridente, resignação homogeneizada com felicidades. A consciência dos seres alienados que somos, surge quando o algoz, já há muito tempo sugando como um percevejo seus miseráveis e escravos trabalhadores, aprisiona no trabalho/emprego os sujeitos, e ela, essa tal consciência, desvela-se sem percepção intelectual, mas em ações marginais, concretas que aos poucos não afetam o patrão/algoz, mais uma parte ínfima da parcela lucrativa da grande fábrica “salvadora” de vidas desempregadas (livres, para atuar, de maneira marginal e sábia, contra os opressores donos de tudo, pois aqui não existe modos de produção, ferramentas de trabalho ou qualquer que seja a definição economista dos termos análogos). É no tomar para si, não se trata de roubo, mas de ter a possibilidade de encontrar um modo astucioso de carregar o que é seu de direito, direito entendido aqui fora da órbita positiva/legal, mas propriedade dos que são escravizados e sua escravidão justificada legalmente pelos donos de tudo, tomar para si é reencontrar as suas forças em forma de produto. Trabalhador, termo caduco e desgraçado, ache uma forma meticulosa de avariar os produtos da fábrica/loja, de subtrair centavos deste lugar maldito, de esconder em suas vestimentas ou acessórios o produto que sabes que é seu de direito, comercialize a terceiros e goze dessa parcela insignificante perante aos abusos que sofremos ao longo de nossas vidas empregadas. Recordações de leituras sobre um factótum, identidade, lugar comum, aspectos íntimos, ou ainda, palavras de um não tão mais solitário vagabundo.
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