Foi um olhar, uma companhia para
um gole de cerveja, poucas palavras, mas uma aproximação espontânea e
inesquecível. Guardei aquela imagem na memória, sentia uma espécie de sensação
atraente, algo naquela garota me atraia, eu queria conhecê-la. Tinha receio de
falar alguma besteira, sempre que a via não sabia o que dizer, me aproximava e
lhe oferecia algo para beber. Ela nunca recusava e isso me deixava maluco,
doido, eu queria beijar aquela boca, seu batom vermelho. Recordo que estávamos
numa mesma festa, numa cidade no interior da Paraíba, eu a vi e fui em sua
direção. Ela estava tomando cerveja, me ofereceu um gole, não resisti, ela
pegou na minha mão e me puxou para dançar. Eu nunca arrisquei a fazer algo do
tipo, ela me embalava, conduzia nossos passos e eu me deixei levar, sentia o
seu cheiro, agarrei seu corpo contra o meu e quando a música acabou, nos
despedimos. Fiquei com sua imagem na cabeça, loira, boca vermelha e o cheiro de
cerveja. Sai daquela cidade tão bêbado que quando cheguei em casa não conseguia
dormir, queria conhecer melhor essa mulher. Foi rápido e me surpreendi quando
tive uma nova oportunidade. Fomos atrás de mais cerveja, ainda ressacados da
noite anterior, uma festa pouco atrativa na universidade, tudo tão entediante e
repetitivo, o país usurpado por políticos mafiosos e nós ali, sem muitas
expectativas, rodeados de estudantes que pareciam acreditar em alguma mudança
significativa. Enfim, um amigo que a conhecia convidou ela para nos acompanhar,
tomar algumas cervejas e jogar conversa fora. Era isso o que nos restava no
interior do país. Encontrei com ela novamente, todos bebíamos e eu só tinha em
minha cabeça aquela boca, aquele cheiro e seu corpo em meus braços. Tentava
afastar esses pensamentos, tentando conversar e me envolver com os demais, inútil!
Eu esperava que naquela noite eu poderia ter algum sucesso, e eu sentia, também
desconfiava que ela queria algo. Ficamos a sós inúmeras vezes e não tive
coragem de ir além, de dizer a ela o que estava sentido, queria tocá-la, pôr as
mãos em seu rosto, sentir seu perfume com o rosto próximo de sua orelha. Estava
embriagado de desejo só em idealizar, nessa construção mental, as figuras que
tomavam corpo. Mas foi ela quem tomou iniciativa acariciando minha mão, meu
braço, depois meu rosto. Quero te beijar! Disse a ela de repente, ela sorriu,
hesitou por um momento, e me beijou. Todo meu corpo estremeceu, queria beijar
mais forte, intenso, molhado. No meio da sala estávamos sozinhos, as outras
pessoas foram embora e o dono da casa parecia estar deitado no seu quarto. Era
tarde da noite, não parávamos de beijar, era o estar vivo, o querer ser o outro
incansavelmente, e lá fora a cidade inteira era cumplice, junto com os astros e
os gatos que em cima do muro assistiam aqueles dois se desejarem. Daqui em diante
a história continua, terei que omitir os fatos futuros e o transcorrer dos
acontecimentos. A vida é curta em seus escassos momentos de prazer, e a escrita
não sacia meu viver. Depois de dar conta disso, passo o gesto adiante e me
perco longe das certezas descritivas, eram cervejas geladas e outra vida, o
amor como um copo transbordando e sendo desejado por uma boca ávida de sede.
Á-vida de vida.
Bom, pra quem gosta de uma boa música aqui vai uma dica que, em minha opinião, despertará a curiosidade acerca deste nome. Minha dica é o cantor, poeta, pintor e compositor Belchior. É isso pessoal, por mais que alguns afirmem que existem “intocáveis” compositores brasileiros, a exemplo de Chico Buarque, Tom Jobim, Vinícius, dentre outros, este cearense despertou minha curiosidade e me fez perceber que a música não tem limites estéticos, e que não existem tais cantores intocáveis. Sem bajulice ou coisa parecida, aqui escrevo sobre este figura por sentir e perceber a um bom tempo a qualidade de suas composições. A diversidade presente em sua obra é marcante e os ritmos se confundem numa salada de poesia, filosofia e estilos musicais. Inúmeras são as músicas que há tempo são apreciadas pelo gosto popular: “Apenas um rapaz latino-americano, Medo de avião, Fotografia 3x4 e Tudo sujo de batom”, são exemplos que já se tornaram banais. Sua originalidade estética não se resume apenas a es...
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