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Um tipo cansado


Cansado com o mundo e as coisas, esqueci dos tempos outrora em que fui feliz. Hoje não tenho tanta disposição para com as ocupações humanas que me impõem trabalho, estudo, paixões, deveres cívicos etc., tudo isso me é cansativo. Talvez eu não tenha vocação para nada e a vida tenha se tornado um embuste construído por mãos inúteis como as minhas. Tenho nos últimos dias hipoteticamente me projetado para um futuro determinado que criei e que me consola das desilusões tão reais. Um vício humano em querer determinar o incerto, confrontando com vazios impreenchíveis próprios da fatídica natureza humana. A vida, esta pluralidade de momentos fugazes, onde violentamente e despercebidamente vivemos e envelhecemos tanto em corpo quanto mentalmente, é contraditória, tanto no que diz respeito a nossa condição existencial, como também, das outras coisas e seres presentes no mundo e no universo. Pouco me importar saber como que esta vontade íntima presente em todos os seres vivos surgiu, para mim tem pouca, ou quase nenhuma relevância. “A vida surgiu acidentalmente, tudo não passou de um grande equívoco”. Assim, me informou um dogmático professor de filosofia. Mas, essas questões nunca me interessaram. Acreditei nas minhas fantasias de infância, fui ingênuo quando todos maliciosamente viviam, me entorpeci na felicidade e depois chorei quando essa embriaguez passou. “Porque ser tão negativista?” Alguns me diziam isso, me acusando de certa fraqueza, mas quem são eles para me chamarem de negativista quando todos eles esquecem ou, fazem se esquecer de quem realmente são. Há um bom tempo que tento não me enganar com as frivolidades que o cotidiano me impõe. As palavras, nossos gestos, as conversas, onde cada um de nós maquinalmente abre e fecha a boca, será que realmente damos tanta importância a tudo isso? As universidades estão cheias de uma suposta seriedade, aqueles doutores fazem de suas verdades mercadorias, seus sentimentos são comprados de outros doutos mais repugnantes ainda. Cansei e ainda me canso com certas coisas. Não me introduzi em nenhuma facção, grupo, categoria, nomenclaturas sociais numa estrutura vertical. Sou no mais dos pesares um cidadão incomum, incompleto, indeterminado e infeliz. “Você se faz de vítima!”, preferi ficar sem responder tal acusação, preferi sentar acender um cigarro e tirar uma baforada para o alto. Dentre inúmeras verdades escolhi aquela que grita silenciosamente dentro de nós, que nos impulsiona a viver sem explicações, sem contornos, sem perca de tempo. Inquieto e fatigado numa contradição inapreensível coloquei a baixo as pilastras do sagrado, do tradicional, comum e de tudo imposto como real. Se a vida não for cansativa, um fardo sobre todos nós, é porque o nada se objetivou, a morte se fez presente tornando o ser em não ser. O corpo envelhece e torna-se insuportável, da mesma forma a mente se desgasta e se torna frágil. “Isso tudo não passa de uma alucinação, você é louco”. A loucura é uma dádiva e não uma escolha. Viver num mundo próprio zombando das instituições e dos homens, quem dentre nós possui tamanha coragem? As pessoas na maioria das vezes cospem palavras. Existe um discurso comum que bestializa todo o corpo social, e ele é o mesmo que se aprende nas escolas. “Você tem problemas mal resolvidos.” Só um não, tenho inúmeros problemas, e sem eles não sei o que seria de mim. A plenitude é tediosa, a virtude é convencional, e as carências fazem viver nossos desejos. Não sei se devo aceitar, resignar-me perante as imposições do nosso modo, modelo de vida. “Trabalhar é necessário”. Todos afirmam. Tenho outra noção do que seja trabalho, diferentemente da postura capitalista cristã. Não me estimo mais em querer saber qual será o meu futuro. Volto a repetir, cansei...

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